quinta-feira, 11 de junho de 2009

Sanfoneiros da Gota

Nessa época de festas juninas o Nordeste se transforma. O forró toma conta das cidades e quem trabalha em comunicação acaba se envolvendo diretamente na cobertura desses eventos, cada vez mais profissionais e grandiosos. E esse mês de junho me fez lembrar de duas histórias. Dois encontros com sanfoneiros famosos que nunca deixaram de lado suas características de simpatia e simplicidade.

O primeiro caso foi durante o Festival Nacional de Arte em João Pessoa. Eu havia sido destacado prá ficar dez dias seguidos na capital paraibana. Fazia matérias para o telejornal da noite e aproveitando a estada, fechava também reportagens no esquema "plano-sequencia" para o programa das manhãs, um feminino-variedades-culinária-informação. Aquela velha fórmula já conhecida de todos. Como os dois produtos eram de rede, não tinha muitos problemas de acesso às pautas que eu mesmo imaginava e "vendia" para São Paulo, já que não tinha produtor me acompanhando. Num daqueles dias o sanfoneiro Sivuca iria se apresentar com a Orquestra de Câmara. Um encontro que, com certeza, valia ser registrado. Consegui marcar com ele no meio da tarde. Uma das conversas musicais mais agradáveis que já fiz. Finda a gravação, o mestre da sanfona me pergunta se eu gostava da música dele (claro que sim!). Respondi que, na infância, gostava de ouvir "Feira de Mangaio", gravada pela Clara Nunes. Dito isso, ele empunha a sanfona e anuncia:"- Então, de Sivuca e Glorinha Gadelha, Feira de Mangaio". E passa a tocar a composição. Apesar de não ter entendido a razão, eu tratei mesmo foi de aproveitar a apresentação exclusiva. O cinegrafista nem lembrou de ligar a câmera. E o objetivo não era esse mesmo. Sivuca ainda me contou a história da composição, feita pelo casal num momento de saudade nos Estados Unidos.

A outra história foi mais recente. Eu era gerente de jornalismo de um canal voltado para o agronegócio brasileiro, mas naquele dia estava apresentando um dos programas. Era uma espécie de revista rural com entrevistas, entradas ao vivo e reportagens especiais. A última atração era sempre musical. Naquele dia, havíamos marcado com Dominguinhos. Um músico extraordinário, autor de vários sucessos e que, ao contrário de muitos menos famosos que ele, costumava chegar sozinho nas entrevistas. Entre uma prosa e um trecho de música, resolvi perguntar a ele como era o processo de composição. Um momento de silêncio e ele começou a tocar a sanfona. Uma melodia manhosa, que me remeteu imeditamente ao interior. Não sabia o que ele estava fazendo e por isso não o interrompi. Talvez dois minutos depois ele parou e me perguntou: "-Tá gravado? É uma composição inédita. Pode pôr no disco". E riu. Mais uma lição inesquecível do talento de um mestre. Sanfoneiros da gota serena, como se diz no Nordeste nessa época de São João e forró.

2 comentários:

  1. É muito legal ler a respeito de tais experiências. Percebo um dos valores do jornalismo, o que permite ampliar nossa visão a partir do conhecimento de culturas e modos de viver distintos... além de ter a chance de apresentá-los ao outro.
    Lembro do que afirma Francisco Karam: "O direito social à informação inclui a diversidade de significação do mundo..."

    ResponderExcluir
  2. Penso como Ticiana.

    Viva o fazer jornalismo!!!!

    Parabéns!!!

    ResponderExcluir